A partir desse dia tornaram-se grandes amigos.

Às quatro da tarde, quando ela voltava do colégio, encontravam-se junto do velho carvalho.
Ele encarrapitava-se no ombro dela e assim davam grandes passeios pelo jardim. Se aparecia alguém, Isabel escondia-o no bolso ou no cesto que trazia sempre cheio de flores.

Ele ensinava-lhe muitas coisas.

- Tu não tens livros e nunca estiveste num colégio nem numa universidade, como é que sabes tantas coisas? – perguntou-lhe ela um dia.
Bem – respondeu ele – nós os anões vivemos quinhentos anos e assim temos tempo de ver muito, pensar muito. E temos uma grande memória. Quando somos novos, os velhos anões contam-nos tudo quanto viram, durante os cinco séculos da sua vida. E também nos contam tudo quanto os pais deles lhes ensinaram. Ora um anão que ouve uma coisa fica a sabê-la de cor para sempre. É por isso que eu te posso contar histórias que se passaram há mais de mil anos. Além disso viajamos muito.

- Como é que podes viajar com umas pernas tão pequenas? – perguntou Isabel.

Viajamos pelo mundo todo a cavalo nos pássaros. Nós somos grandes amigos dos pássaros. E quando eles na Primavera e no Outono emigram em bandos, levam-nos com eles sempre que temos vontade de mudar de sítio ou de ir ver o mundo. Eu já estive na Pérsia, no Pólo Norte e na Índia e fui com uma cegonha branca desde a Alsácia até ao Norte de África. E é por isso que sei todas as línguas da terra, as dos homens e as dos animais. Sei conversar com um turco e sei conversar com uma perdiz.

Isabel, maravilhada, ouvia.

O anão contava-lhe histórias do passado, histórias de moiros, guerreiros, navegadores, princesas e reis antigos. Depois falava dos países distantes: descrevia as caravanas de camelos que atravessam lentamente o grande deserto do Sara e descrevia os esquimós que vivem no Pólo Norte em casas feitas de gelo.
Mas havia uma coisa que o anão nunca lhe contava: era a sua própria vida.
Em vão ela lhe perguntava porque é que vivia sozinho naquela quinta, longe de todos os outros anões.

- Por enquanto não te posso responder – dizia ele. – Primeiro preciso de te conhecer melhor para saber se mereces que eu te conte a minha história.

Sophia de Mello Breyner Andresen, A Floresta

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